EQUIPA DA ADF
Enquanto uma grande quantidade de cidadãos sudaneses tenta fugir da violência através da fronteira com o Chade, membros do grupo étnico Masalit relatam que homens armados os estão a impedir de sair.
“Os milicianos perguntam aos que fogem sobre a sua origem tribal,” uma mulher não identificada disse recentemente à Rádio Dabanga. “Os Masalit não são autorizados a atravessar a fronteira para o Chade.”
Os membros de outros grupos étnicos podem atravessar a fronteira depois de inspeccionados. Mais de 10 postos de controlo das milícias estão alinhados na estrada entre El Geneina, a capital do Darfur Ocidental, e a fronteira com o Chade. Ao longo do caminho, os homens armados terão roubado telemóveis e dinheiro aos que fugiam.
A região de Darfur é um mosaico complexo de grupos étnicos e clãs árabes e não árabes. No Darfur Ocidental, os principais grupos étnicos são a maioria Masalit, bem como os Eringa, os Gimir, os Misseriya Jebel e os Zaghawa.
Vários grupos, incluindo os Masalit, atravessam a fronteira entre o Chade e o Sudão, o que leva alguns observadores a recearem que as rivalidades étnicas no Sudão possam alastrar-se para o Chade.
A mistura de etnias do Darfur Ocidental tem sido motivo de conflito durante décadas. O ex-ditador Omar al-Bashir explorou essas divisões durante o seu governo, acabando por desencadear
uma campanha de violência genocida, há duas décadas, com os Janjaweed árabes contra os grupos não árabes.
Os sucessores rivais de al-Bashir — o General Abdel Fattah al-Burhan, chefe das Forças Armadas do Sudão (SAF), e o general vulgarmente conhecido por Hemedti, líder das Forças de Apoio Rápido (RSF) — estão a usar o mesmo manual enquanto expandem a sua batalha contínua pela supremacia, através das históricas animosidades tribais e rivalidades de clãs de Darfur.
Em Cartum, os soldados das SAF têm como alvo jovens da tribo Misseriya que consideram ser apoiantes das RSF.
Hemedti é membro do ramo Mahariya do grupo étnico árabe Rizayqat. As RSF, que surgiram como sucessoras da Janjaweed, são constituídas principalmente por árabes Abbala e Baggara, pastores de camelos e de gado da região de Darfur. Os Baggara incluem os Rizayqat e o povo Fur, que dá nome à região. Os Masalit referem-se à região como Dar Masalit.
Com o aumento das tensões entre al-Burhan e Hemedti no início deste ano, al-Burhan contactou Musa Hilal, antigo líder da Janjaweed e rival de Hemedti, e membros do seu clã Mahamid, de Rizayqat, para apoiarem os seus esforços em Darfur.
Depois de terem eclodido combates entre al-Burhan e Hemedti em Cartum, 10 dias depois rebentaram batalhas em Darfur, onde Hemedti tem o seu quartel-general. Os grupos étnicos armaram-se rapidamente e formaram as suas próprias forças de defesa.
“A situação de segurança em Cartum representa uma série de ameaças para o povo de Darfur, porque não há ninguém para controlar estas milícias [árabes],” Ahmed Gouja, um jornalista local e observador dos direitos humanos, disse na altura à Al Jazeera.
Os combates em Darfur opuseram as RSF aos grupos locais e não às SAF. Entre as vítimas da violência conta-se o governador do Darfur Ocidental, Khamis Abakar, um Masalit. Abakar denunciou os assassinatos cometidos pelas RSF numa entrevista a jornalistas da Arábia Saudita em meados de Junho.
“Os civis estão a ser mortos indiscriminadamente e em grande número,” disse Abakar à Al Hadath TV. “Não vimos o exército sair da sua base para defender as pessoas.”
O seu corpo foi encontrado em El Geneina pouco depois da transmissão da entrevista. Segundo o administrador do Darfur Ocidental, Salih Hasan, os Masalit não são os únicos alvos da violência das RSF.
“Todas as etnias que não se juntaram à Janjaweed são visadas, o que obrigou a maioria delas a procurar refúgio no Chade, incluindo as tribos árabes,” disse Hasan à Rádio Dabanga. “Isso é uma limpeza étnica, e a comunidade internacional tem de activar o Capítulo VII da Carta das Nações Unidas.”
O capítulo VII da Carta das Nações Unidas estabelece as condições para a criação de operações de manutenção da paz.
Os assassinatos forçaram o chefe da tribo Masalit, Sultan Sa’ad Bahreldin, a fugir para o Chade em Junho. A sua mulher, a advogada de direitos humanos, Nahid Hamid, disse à Al Jazeera que ele fugiu com a família pouco depois de os combatentes árabes terem invadido a casa do seu irmão e o terem matado.
“Depois de o seu irmão mais velho ter sido morto em sua casa, o sultão e toda a sua família fugiram,” disse Hamid. “Os seus filhos, os seus irmãos e irmãs e toda a gente.”