EQUIPA DA ADF
Durante dois dias, membros das Forças Armadas do Sudão (SAF) defenderam uma instalação industrial militar em Yarmouk dos ataques das Forças de Apoio Rápido (RSF) paramilitares. No dia 7 de Junho, enquanto um incêndio deflagrava perto do local, as RSF publicaram um vídeo em que afirmavam ter tomado o controlo de um armazém cheio de armas de fogo e munições.
Para os especialistas que acompanham a violência, incidentes como este confirmam um receio de que as armas possam ser saqueadas e circular dentro e fora do país.
“Em qualquer lugar onde haja falhas de segurança nas instalações de armazenamento de armas, então, sim, algum desse material pode encontrar o seu caminho através das fronteiras e para os Estados vizinhos,” Khristopher Carlson, investigador sénior e coordenador de projectos do Small Arms Survey, com sede em Nairobi, disse à ADF. “A possibilidade continua a existir enquanto este conflito continuar e enquanto esses armazéns de armas e a sua segurança permanecerem em dúvida.”
O Sudão é um dos maiores fabricantes de armas e munições em África. A indústria prosperou na década de 1990, durante o regime do antigo ditador Omar al-Bashir, com a criação da Corporação da Indústria Militar do país. Al-Bashir utilizou as armas para armar grupos internos leais e combatentes estrangeiros, incluindo o Exército de Resistência do Senhor no norte do Uganda e nos países vizinhos. O Exército de Resistência do Senhor (LRA, na sigla inglesa) foi considerado uma organização terrorista devido aos seus ataques macabros contra civis.
“Ele queria aumentar a sua capacidade militar, não só com as forças militares imediatas do Sudão, mas também com outras que tinham convicções políticas alinhadas e que podiam ser chamadas a apoiar,” disse Carlson. “Isso permitiu a Bashir envolver-se indirectamente, através destes representantes, noutros conflitos na região.”
A nível interno, o Sudão tornou-se uma nação fortemente armada. De acordo com o SAS, existem mais de 3 milhões de armas de fogo no país, a maioria das quais nas mãos de cidadãos privados. Isso faz com que seja o segundo país mais armado da África do Norte ou Oriental, depois do Egipto.
Agora, essas vastas reservas de armas estão a ser utilizadas numa guerra civil. Carlson disse que as RSF e as SAF parecem ter amplas reservas de armas ligeiras e de pequeno calibre (ALPC) e de munições. Um dos desenvolvimentos mais perigosos é o facto de as RSF terem obtido mísseis terra-ar portáteis SA-18 (MANPADS) de fabrico russo. Esses mísseis constituem uma ameaça para os aviões civis e militares.
“Trata-se de um desenvolvimento de alguma importância, uma vez que as RSF continuam a tentar reforçar a sua capacidade de defesa contra ataques aéreos,” disse Carlson.
A preocupação mais geral é que a insegurança faça com que ALPC proliferem no país e desencadeiem outros conflitos. No Darfur, habitantes desesperados estão a pagar 1.200 dólares por uma metralhadora Kalashnikov e 2 dólares por cada bala, de acordo com uma reportagem da France24. Eles dizem que não têm escolha.
“É muito fácil obter armas no Darfur: basta ter dinheiro suficiente,” disse um residente anónimo à France24. “Os habitantes financeiramente mais abastados têm podido comprar armas ligeiras para se defenderem. Não podem ficar de braços cruzados.”
Carlson disse que em algumas partes de Darfur, representantes do governo estão a distribuir armas. O governador regional, Minni Minnawi, recorreu ao Twitter para exortar os cidadãos a armarem-se. Esta quebra de ordem está a fazer aumentar a procura de armas e, com ela, o risco de a violência alastrar-se.
“Isso demonstra uma falta de segurança formal,” disse Carlson. “Os civis estão a ser chamados a lidar com isto sozinhos porque o Estado percebe que não os pode proteger.”