Especialistas: O Destino do Sudão Poderá Assemelhar-se ao da Líbia Dividida?

EQUIPA DA ADF

Os cessar-fogos fracassaram. Os lados rivais parecem estar em pé de igualdade. Os homens do topo estão cada vez mais enraizados na sua oposição mútua. Os actores regionais estão a tomar partido. Os observadores dizem que já viram estes factores antes e perguntam-se se o Sudão poderá estar a caminhar para o tipo de divisão que paralisou a Líbia durante anos.

Durante quase uma década, a Líbia esteve profundamente dividida entre governos rivais, um em Tripoli, reconhecido pela comunidade internacional, e outro dirigido pela Câmara dos Representantes, na cidade oriental de Tobruk.

As facções passaram sete anos a lutar antes de estabelecerem um Governo de Unidade Nacional, em 2021. Apesar disso, os rivais não conseguiram trazer a estabilidade e a paz de volta ao país, que continua a ser um paraíso para os mercenários do Grupo Wagner da Rússia e outros combatentes estrangeiros.

No Sudão, os combates que eclodiram a 15 de Abril opõem as Forças Armadas do Sudão (SAF), dirigidas pelo General Abdel Fattah al-Burhan, às Forças de Apoio Rápido (RSF), uma milícia dirigida pelo General Mohamed Hamdan Dagalo, também conhecido por Hemedti.

“É provável que al-Burhan e Dagalo lutem até ao fim, pois os seus objectivos são muito ambiciosos,” escreveu recentemente o analista Mohamed Chebaro no Arab News. “Os observadores sudaneses alertaram, muitas vezes, para as forças maciças de que dispõem e que podem deixar um longo rasto de destruição.”

Os analistas dizem que o confronto entre al-Burhan e Hemedti tem vindo a desenvolver-se desde que o ditador de longa data, Omar al-Bashir, criou as RSF como contrapeso às SAF, há mais de uma década. Uma lei de 2017 estabeleceu formalmente as RSF como uma força de segurança independente. Cada grupo tem cerca de 100.000 membros.

Segundo Ahmed Soliman, analista do grupo de reflexão Chatham House, com sede em Londres, é improvável que os combates terminem a curto prazo.

“As RSF constituem uma força muito mais móvel — muito resistente à batalha, utilizando tácticas de guerrilha em áreas urbanas — enquanto as forças armadas sudanesas têm poder aéreo, tanques e melhor logística,” disse Soliman ao Gulf Times.“Com o tempo, poderão conseguir empurrar as RSF para fora de Cartum … se esse cenário se concretizar, haverá uma maior contestação na região de Darfur, cujos efeitos já estamos a começar a ver.”

Desde o início dos combates, os dois lados dividiram a capital.Centenas de civis morreram nos combates e mais de 700.000 pessoas fugiram das suas casas.

As RSF tomaram recentemente a base militar de Merowe, no norte do Sudão, enquanto as SAF destruíram um local de reabastecimento das RSF, no noroeste do Sudão, poucos dias depois de as RSF terem recebido um carregamento de armas do Grupo Wagner da Rússia, através da sua base no sul da Líbia. As SAF também atacaram a base de operações de Hemedti em Darfur.

Embora os grupos multinacionais continuem a pressionar as duas partes para que cessem os combates, alguns actores regionais começaram a apoiar os generais rivais. O Egipto manifestou o seu apoio a al-Burhan e às SAF, tal como a Liga Árabe. Hemedti recebeu armas do marechal líbio, Khalifa Haftar, e do Grupo Wagner, seu aliado na extracção de ouro.

A nível financeiro, as duas partes também estão bem equiparadas. Hemedti e as RSF beneficiam da vasta fortuna que o general construiu com as operações de extracção de ouro que ele e a sua família controlam em Darfur. Al-Burhan e as SAF beneficiam da extensa rede de empresas — desde a agricultura à produção de petróleo e ao fabrico de armas — que alimentam as receitas das forças armadas.

Com as forças em pé de igualdade, o Sudão poderá estar preparado para um período prolongado de combates, segundo Mohanad Hashim, correspondente sudanês da BBC.

“Antes do início da guerra, vimos tanto Hemedti como o General Burhan a alimentar as divisões étnicas, dirigindo-se aos seus próprios círculos eleitorais,” disse Hashim à BBC.

Esta estratégia, em última análise, poderia criar um cenário em que o país se dividisse em linhas étnicas baseadas na sua lealdade às RSF ou às SAF, de acordo com Soliman.

Os analistas dizem que um factor pode fazer pender a balança no conflito: o poder de fogo substancialmente superior das SAF. Os militares têm à sua disposição jactos de combate, artilharia e até drones explosivos. A sua utilização contra os combatentes das RSF — em especial nos bairros civis de Cartum — poderia revelar-se desastrosa.

“Estão essencialmente a desafiar o exército a destruir a sua própria cidade,” Alan Boswell, do Grupo Internacional de Crise, disse à BBC. “Presumir-se-ia que [o exército não] quer destruir Cartum. Mas para eles esta é uma luta existencial.”

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