Paz Continua Ilusória na Casamança Quando o Tráfico Alimenta a Violência

A população da Casamança, cansada de guerra, está desesperada em busca da paz, mas o tráfico de madeira e de cannabis continua a alimentar o conflito.

Um acordo assinado em Agosto de 2022 entre o líder partidário do Movimento das Forças Democráticas de Casamansa (MFDC) e o Senegal trouxe alguma esperança de que o conflito, que dura há 40 anos, pode estar a aproximar-se do fim. O vizinho Guiné-Bissau mediou o acordo.

Mas imediatamente os observadores questionaram se o acordo podia perdurar, uma vez que foi assinado pelo líder de apenas uma facção do MFDC e as outras facções não estiveram presentes.

“Até onde eu sei, este não é um acordo de paz nem sequer um cessar-fogo,” Jean-Claude Marut, um especialista sobre o conflito, disse à Radio France Internationale, em Agosto de 2022. “Parece ser mais uma rendição de uma das componentes principais da rebelião. …Penso que precisamos de colocar em perspectiva a importância do evento.”

A fragilidade do acordo destacou-se no dia 16 de Janeiro, quando um confronto com os rebeldes deixou um soldado senegalês morto e sete outros feridos. As forças senegalesas estiveram a conduzir uma operação para impedir que o MFDC criasse uma base próxima da fronteira gambiana e estavam a destruir os campos de plantação de cannabis que os rebeldes utilizam como uma fonte de receitas.

“Os grupos que foram dispersos não desapareceram,” disse Marut. Acrescentou que pequenos grupos continuam a pilhar, mas a sua capacidade militar encontra-se muito reduzida.

No ano passado, alguns dos aproximadamente 60.000 deslocados começaram a regressar para a região da Casamança, que é geografica e culturalmente distinta do resto do Senegal. Os regressados encontram uma atmosfera, muitas vezes, descrita como sendo “nem de guerra, nem de paz.” As condições são agravadas pelas minas terrestres deixadas ao longo de décadas de conflito.

“Eu tinha acabado de regressar para a aldeia depois de alguns anos no exterior por causa da guerra,” Charles Ndeeky, um homem que perdeu uma perna numa explosão de uma mina, disse à DW.com. “Nessa altura, as autoridades disseram-nos que aquela área estava segura. Mas estavam errados.”

O Centro Nacional de Desminagem do Senegal afirma que 49 dos 170 hectares de terra, predominantemente na região de Ziguinchor, encontram-se minados. O centro documentou 453 civis feridos e 157 mortes por minas desde que o conflito começou, comunicou o canal Al-Jazeera.

Um outro impedimento para a paz é o tráfico ilegal. A região alberga árvores de pau-rosa, que são apreciadas por produtores de mobílias na China devido à sua cor vermelha única. O Senegal perdeu mais de 1 milhão de árvores desde 2010, de acordo com a Agência de Investigação Ambiental.

“As árvores são cortadas secretamente à noite ou em plena luz do dia apresentando licenças falsas,” Fossar Dabo, um professor de física e activista, disse à DW.com. “Depois a madeira é movimentada pela fronteira gambiana, de onde é exportada para China.”

O pau-rosa foi declarado virtualmente extinto na Gâmbia, mas o país continua a exportar grandes quantidades dele para a China. A madeira é abatida e traficada a partir das florestas senegalesas, numa economia ilícita que financia grupos rebeldes.

“Todos os meses encontramos dezenas de árvores destruídas. Desta forma, a nossa terra corre o risco de sofrer desflorestamento e desertificação,” disse Dabo, que fundou um grupo chamado Green Sedhiou, para protestar contra o contrabando de madeira. “Como casamansenses, não podemos perder esta riqueza de valor inestimável.”

As forças armadas do Senegal fizeram com que fosse uma prioridade acabar com o tráfico de drogas e de madeira e reconquistar o território ocupado pelos rebeldes. Durante um esforço massivo, lançado em Março de 2022, conhecido como operação North Bignona, o exército reuniu elementos de terra, ar e logística enquanto sistematicamente limpava a área fronteiriça da Gâmbia. A operação resultou na destruição de 18 bases rebeldes, 140 toneladas de cannabis sativa e na captura de inúmeras armas, viaturas roubadas e apreensão de traficantes.

Uma ofensiva anterior, lançada em 2021, tinha retirado os rebeldes da região do sul do rio Casamança, próximo da fronteira com a Guiné-Bissau.

Durante uma visita às tropas na região de Ziguinchor, em Maio de 2022, o Chefe do Estado-Maior do Exército do Senegal, General Cheikh Wade, expressou determinação para concluir a luta.

“O MFDC está condenado à uma morte que pode ser lenta, mas é certa,” sentenciou Wade. “E o processo é irreversível.”

Analistas afirmam que o grupo rebelde já está muito enfraquecido pelas ofensivas militares, mas alertam que este pode se reagrupar numa nova fortaleza. Uma possibilidade é o vasto Parque Nacional de Niokolo-Koba, na região oeste daquele país, onde a mineração ilícita do ouro e a caça furtiva podem oferecer novas fontes de rendimento.

“Será que as ofensivas militares decisivas e o enfraquecimento de zonas alternativas tradicionais na Guiné-Bissau e na Gâmbia irão marcar o início do fim para o MFDC?” escreveu a Iniciativa Global Contra o Crime Organizado Transnacional, num Boletim de Risco, de Outubro de 2022. “Ou os rebeldes irão meramente deslocar-se geograficamente, procurando por fontes alternativas de financiamento?”

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