Mohamed Znagui Sid’Ahmed Ely conhece bem os desafios de segurança do Sahel. Um antigo Brigadeiro-General do Exército da Mauritânia passou algum tempo em posições de comando, como instrutor e no quartel-general daquele país. Ele diz de forma humilde, “A minha carreira é uma carreira normal de um oficial,” mas o seu currículo demonstra que ele esteve na linha da frente da luta contra os extremistas naquela região.
Comandou o Comité Conjunto de Pessoal Militar (CEMOC) daquela região, em Tamanrasset, Argélia, e mais tarde foi nomeado Inspector-Geral das Forças Armadas da Mauritânia. Ele também passou tempo no exterior como adido de defesa.
Em 2015, ele deixou o activo e tornou-se chefe do Departamento de Defesa da força recentemente criada G5 do Sahel. Na altura, a situação de segurança era particularmente perigosa. Os grupos extremistas tinham sido repelidos do norte do Mali pelas forças chadianas e francesas, mas tinham-se reagrupado e formado uma base de operações na zona da fronteira tríplice entre Burkina Faso, Mali e Níger, conhecida como Liptako-Gourma.
“Ele refugiaram-se nas zonas de travessia fronteiriça que são remotas, de difícil acesso e abandonadas pelos Estados,” Sid’Ahmed Ely disse à ADF. “Eles transformaram-nas em zonas sem lei, onde eles ganharam a lealdade ou aterrorizaram as populações, praticaram tráficos ilícitos e lançaram ataques contra as populações rurais e urbanas e contra as forças nacionais e internacionais presentes.”
Em 2017, a Força Conjunta G5 do Sahel foi criada e aclamada como uma solução interna para os desafios de segurança do Sahel. Composta por 5.000 soldados em sete batalhões espalhados por três zonas, foi concebida para acabar com os terroristas nas regiões fronteiriças e combater o crime transfronteiriço, como o tráfico de droga. Mas enquanto esta força entra no seu quinto ano, o panorama de segurança da região continua desolador.
Mais de 5.000 pessoas foram mortas em ataques ou em combates armados em 2021 e mais de 2 milhões de pessoas encontram-se deslocadas. Em 2021, aproximadamente 29 milhões de pessoas no Sahel precisavam de ajuda e de protecção, um aumento de 5 milhões de pessoas em comparação com 2020, de acordo com as Nações Unidas.
Sid’Ahmed Ely é rápido em afirmar que existe muito trabalho por se fazer.
“A situação hoje ainda é preocupante, e a força conjunta ainda tem falta de meios necessários para a sua missão,” disse.
Ele também acredita que a crise está a ser alimentada por factores que estão para além das fronteiras dos países do G5 do Sahel: Burkina Faso, Chade, Mali, Mauritânia e Níger. A guerra civil da Líbia causou um alastramento de combatentes e de armas que entraram nos países sahelianos. A perda de terreno pelo Estado Islâmico no Médio Oriente também causou receios de que o Sahel iria atrair combatentes estrangeiros experientes.
“O terrorismo (em vez de utilizar a palavra jihadismo, que é um termo erróneo) nunca foi saheliano,” disse Sid’Ahmed Ely. “Foi importado para nós e enxertado para os nossos problemas locais a fim de produzir a situação complexa em que vivemos hoje. As vastas áreas desertas, a atracção de lucros através de tráfico criminoso, a situação prejudicial na nossa região, a precariedade dos nossos meios e a relutância da comunidade internacional fazem com que eu receie que uma nova onda de terrorismo possa vir para nossa região.
Mas ele insiste que a força conjunta obteve ganhos.
O sucesso pode ser medido na cooperação regional. Há pouco tempo, a cooperação entre os cinco países era desonesta e, por vezes, claramente hostil. Agora os países criaram uma Plataforma de Cooperação da Segurança; fundaram um Centro de Análise e Alerta Antecipado em Ouagadougou, Burquina Faso; e fundaram o Centro de Fusão de Niamey, Níger. As forças multinacionais treinam de forma conjunta no Colégio de Defesa G5 do Sahel, em Nouakchott, Mauritânia, e no Colégio de Segurança Saheliana de Bamako, Mali. Brevemente, uma academia de polícia regional será aberta em N’Djamena, Chade.
“Em tão curto período de tempo e vindo de cinco países, foi bem-sucedida na integração e no trabalho em conjunto num comando de uma única força,” disse Sid’Ahmed Ely. “Garante a formação pré-destacamento comum para os homens e prepara uma componente da polícia para a supervisão judiciária e a conformidade com a lei.”
A nível operacional, a força conjunta criou grupos de acção rápida de guardas em cada país, que são treinados e equipados para as missões de combate ao terrorismo.
Sid’Ahmed Ely, em particular, aclama a coordenação sem igual das forças através do Posto de Comando Aliado de Bamako, que tem autoridade sobre a sede das três zonas. Um comando conjunto separado foi criado em Niamey para coordenar com as forças estrangeiras aliadas, como a França, na região de fronteira tríplice.
“A estratégia da força conjunta é de agir em zonas em parceria com as forças aliadas e as forças nacionais da região, priorizando as áreas que são frequentemente atacadas pelo inimigo,” disse. “Actualmente, concentra os seus esforços na zona central, que é onde a região da fronteira tríplice se encontra localizada.”
Um sucesso em particular foi a Operação Sama, que foi conduzida em três fases em Liptako-Gourma, ao longo de mais de dois anos. A operação ajudou a recuperar o território e a desmantelar infra-estruturas dos terroristas, capturando equipamento de produção de bombas, motorizadas, combustível, armas e telemóveis. A operação enfatizou acções civis-militares como a distribuição de kits escolares para crianças, assim como rádios e produtos alimentares para adultos. Ofereceu serviços de saúde para os mais vulneráveis.
“As operações ajudaram a manter a pressão sobre grupos armados e de terroristas e a reforçar a confiança entre a Força e as populações civis,” disse a ONU, no relatório do secretário-geral de Maio de 2021. “A Força Conjunta também relata um aumento da colaboração entre as suas unidades e a população.”
Mesmo assim, a força conjunta enfrenta grandes desafios. Tem falta da sua própria capacidade aérea para transportar tropas e equipamento, fazer o reconhecimento ou fornecer apoio aéreo para as forças no terreno. Sid’Ahmed Ely disse que a força conjunta também tem falta de capacidade de ver imagens de satélite e recolher inteligência de forma electrónica.
“Isso realmente prejudica a eficácia da força,” disse. “Esta falta de capacidade aérea pode ser resolvida disponibilizando-a através de outras estruturas, se não for directamente, ou fortalecendo as capacidades nacionais dos países contribuintes, que fornecem apoio aéreo à força conjunta.”
Sid’Ahmed Ely disse que apesar de a força conjunta precisar de recursos, resolver a crise deve ir para além das soluções militares.
“O grau de violência está a tornar-se cada vez mais superior, apesar dos melhores esforços das forças que, deve ficar bem claro, são muito importantes,” disse. “Isso desafia-nos e lembra-nos que a força sozinha não irá resolver os problemas de segurança no Sahel.”
Ele indica que o Sahel está a enfrentar as mudanças climáticas, uma explosão de população jovem, desemprego generalizado e instabilidade política.
“A crise é multidimensional e a solução deve ser global e multissectorial, com um compromisso urgente massivo e abrangente da comunidade internacional.”
Enquanto a aliança do G5 do Sahel entra em 2022, encontra-se numa posição particularmente delicada. A França está a reposicionar as suas forças na região e a dar um fim à sua missão de combate ao terrorismo, a Operação Barkhane. Em Agosto de 2021, o Chade retirou 600 soldados da força conjunta. A ONU estima que a força conjunta precisa de 391 milhões de dólares anualmente para realizar as suas atribuições, mas tem falta de uma fonte de financiamento consistente. Sid’Ahmed Ely disse que o tempo é agora para que a comunidade internacional faça um compromisso para a força conjunta e para o Sahel na forma de um “Plano Marshall,” um investimento internacional que iria servir de bóia para a região. O Plano Marshall original de 1948 ofereceu ajuda estrangeira à Europa Ocidental para reconstituir as zonas assoladas pela guerra.
“Eu espero por um envolvimento maior e mais substancial da comunidade internacional no Sahel, particularmente a nível das Nações Unidas, da União Africana e da União Europeia, para ajudar não apenas a nível de segurança, que é prioritário, mas também para decidir num Plano Marshall para o benefício do Sahel e o cancelamento da dívida saheliana,” disse Sid’Ahmed Ely. “É a este preço, e apenas a este preço, que as tendências de segurança irão ser revertidas e o Sahel irá tornar-se uma zona de segurança e de paz entre África e Europa e entre o Médio Oriente e América.”