EQUIPA DA ADF
Brando Brayend Tewuh, um membro da tripulação indonésio, de 29 anos de idade, a bordo de uma embarcação de pesca chinesa, estava tão cansado de ser agredido fisicamente e de ficar sem comer que ele e três outros membros da tripulação saltaram de um arrastão ao largo da costa da Somália, em Agosto de 2021.
A sua tentativa de alcançar a costa fracassou. Depois de flutuarem no mar durante horas, Tewuh e outros dois foram resgatados pelo barco a partir do qual tinham saltado. Acredita-se que o outro membro da tripulação, Aji Proyogo, se tenha afogado.
“Eu jamais irei trabalhar num navio,” disse Tewuh ao This Week in Asia.
Histórias de maus-tratos contra trabalhadores a bordo de embarcações de pesca chinesas não são raras. Nos últimos anos, pescadores do Quénia e do Gana alegaram publicamente que capitães chineses e membros da tripulação os agrediram fisicamente, forneceram alimentação e abrigo inadequados, obrigando-os a trabalhar longas horas — depois de seus contratos terem expirado, sem receber qualquer pagamento adicional.
Alguns afirmam que também eram obrigados a envolver-se em práticas de pesca ilegal, como a “saiko,” quando o peixe é transferido de um arrastão para uma canoa grande para esconder a origem da captura. As canoas podem transportar cerca de 450 vezes mais peixe do que uma canoa de pesca artesanal.
A pesca de barbatana de tubarão também é flagrante. Depois de a barbatana ser cortada, o tubarão é devolvido à água para morrer.
A Fundação para a Justiça Ambiental (EJF) realizou entrevistas anónimas com trabalhadores ganeses que trabalhavam num arrastão chinês, em 2020. De acordo com as leis nacionais de pesca do Gana, 75% das tripulações das embarcações dos arrastões industriais devem ser de nacionalidade ganesa. Dos 10 membros da tripulação ganeses entrevistados pela EJF todos tinham sido vítimas de abuso ou testemunhas de um acto de abuso contra um membro da tripulação.
“A violência ocorre toda a hora,” um membro da tripulação disse à EJF. “Quando eles despejam o peixe, aqueles que não forem rápidos, o capitão irá levar qualquer coisa que encontrar e atingi-los com ela. Pode ser uma pedra ou qualquer coisa que ele encontrar. Principalmente o capitão.”
Pescadores ganeses disseram à EJF que eram ameaçados com violência caso precisassem de descansar ou esticar-se. Quando um cozinheiro ganês tentou preparar sopa de peixe para a tripulação ganesa, o capitão chinês bateu nele quatro vezes antes de despejar a sopa no mar.
Os observadores das pescas não eram poupados de tratamento brutal, disseram os membros da tripulação.
Alguns viram um observador de pescas ser ameaçado com uma barra de metal quando o observador tentou guardar peixe como provas de pesca ilegal. Um outro observador foi ameaçado com um pau se ele comunicasse que o arrastão tinha descartado ilegalmente peixe no mar. Mais um outro observador foi ameaçado com uma faca quando tentava impedir que peixe juvenil fosse deitado no mar.
Existe também o caso de Emmanuel Essien, um observador de pescas ganês, de 28 anos de idade, que desapareceu em 2019. Essien trabalhava a bordo de um arrastão chinês denominado Meng Xin 15 quando captou imagens de vídeo da tripulação envolvendo-se em saiko.
Duas semanas depois de Essien ter relevado o vídeo e denunciado a prática às autoridades locais, ele desapareceu da sua cabine do Meng Xin 15. De acordo com a EJF, um relatório da polícia afirmou que não encontrou sinais de actos desonestos relacionados com o desaparecimento de Essien, mas a sua família não espera vê-lo de novo.
Entre os membros da tripulação, os pescadores inexperientes talvez recebam pior tratamento.
“Os chineses … quando se é um novo marinheiro e não se é rápido ao separar o peixe, eles irão atingir o principiante com qualquer coisa que encontrarem,” disse um membro da tripulação à EJF.
Para além de violações de direitos humanos, os arrastões chineses estão a dizimar as unidades populacionais de peixe da África Ocidental, através da sobrepesca e da pesca ilegal. A China possui o pior registo de pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN) do mundo, de acordo com o Índice de Pesca INN e teve como alvo a região desde meados da década de 1980.
Os dados sugerem que a frota de pesca de arrasto de fundo chinesa anualmente captura 2,35 milhões de toneladas de peixe, avaliadas em mais de 5 bilhões de dólares na região. Isso é cerca de metade da captura da pesca em águas longínquas da China, de acordo com a EJF. Entre 2015 e 2019, Gana foi o país mais afectado da África Ocidental, seguido pela Serra Leoa e pela Mauritânia.