EQUIPA DA ADF
Enquanto África trabalha para recuperar do generalizado impacto da pandemia da COVID-19, a Fundação Mo Ibrahim identificou 10 desafios fundamentais que afirma que o continente deve vencer para poder compensar o terreno perdido e seguir em frente.
O estudo “COVID-19 em África: Um Caminho Difícil para a Recuperação” tem como base uma década de pesquisas feitas pelo Índice Ibrahim de Governação Africana (IIAG) para identificar 10 desafios que cobrem questões de saúde, sociais e económicas. Tomados em conjunto, todos os desafios centram-se na melhoria da funcionalidade e da responsabilização dos governos e departamentos de saúde pública face a COVID-19 e futuras pandemias.
“A pandemia da COVID-19 provou, mais uma vez, que a África ficará em segundo plano a menos que criemos a capacidade para produzir os produtos médicos de que a nossa população precisa,” escreveu a professora Agnes Binagwaho, vice-presidente do Grupo da Estratégia de Saúde da Fundação África-Europa. Binagwaho esteve entre os especialistas em saúde pública destacados no relatório da fundação.
Eis alguns dos destaques do relatório:
Melhores Dados Estatísticos Vitais
Durante a pandemia, especialistas em matérias de saúde pública tiveram dificuldades para calcular o verdadeiro impacto da COVID-19 no continente pelo facto de serem tão poucos os países que fazem a manutenção dos registos de nascimentos e de óbitos com exactidão.
Embora o registo de nascimentos tenha melhorado, o registo de óbitos teve um declínio durante a pandemia. Apenas oito países possuem um sistema universal de registo de óbitos. Como resultado, a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que o verdadeiro número de mortes pela COVID-19 em África possa ser três vezes superior aos dados oficiais.
“A pandemia da COVID-19 acrescentou uma maior pressão a já enfraquecida capacidade dos registos civis numa altura em que esta é mais importante do que nunca para a definição de políticas de saúde pública, vacinas e protecção social,” disseram os autores do relatório.
Melhor Acesso a Atendimento Médico não Dispendioso
Todos os países africanos comprometeram-se em fornecer atendimento médico universal até 2030, mas até agora, apenas 10 países — Argélia, Botswana, Burkina Faso, Gabão, Maurícias, Namíbia, Ruanda, Seicheles, Tunísia e Zâmbia — alcançaram esse objectivo.
Na África subsaariana, a média de gastos em atendimento médico é cerca de um terço da média global. A demanda causada pelos doentes de COVID-19 obrigou alguns países a desviarem recursos escassos de outras necessidades como os tratamentos de tuberculose, HIV e cancro.
Um inquérito da OMS África concluiu que cerca de um terço dos países registaram interrupções nos serviços de cuidados de emergência e de grande importância por causa da pandemia. A falta de despesas de atendimento médico do continente também está a fazer com que haja fuga de quadros, visto que médicos africanos formados saem à busca de emprego noutras partes do mundo.
Preparação para Futuras Pandemias
Embora os países tenham sido elogiados pela sua resposta rápida no início da pandemia, a COVID-19 rapidamente revelou uma falta de capacidade, porque houve carências de camas dos cuidados intensivos, de oxigénio médico e de equipamento de protecção individual.
“Em termos mais generalizados, [a pandemia] expôs a insuficiência de capacidades humanas e as dificuldades do ambiente de infra-estruturas do continente,” escreveram os autores do relatório.
Com novas doenças que se transmitem de animais para seres humanos (o presumível caminho da COVID-19), a cada ano, uma nova pandemia é inevitável, disseram os autores do relatório.
“A COVID-19 não é uma anomalia,” disseram eles, acrescentando que “investir na preparação é fundamental.”
Isso significa que África deve tornar-se mais auto-suficiente em termos de atendimento médico, de acordo com Binagwaho. Os países africanos devem também fortalecer as suas redes de segurança social de modo a preparem-se para futuras pandemias, de acordo com o relatório.
Reconstruir Espaços Cívicos
Os confinamentos obrigatórios e outras restrições da COVID-19 aceleraram o encolhimento da sociedade civil do continente, incluindo a liberdade de imprensa, que já vem decorrendo por várias décadas. “As restrições pré-existentes aos espaços cívicos foram aceleradas pelo uso quer de medidas excessivas ou pela manutenção de disposições de emergência em vigor durante longos períodos de tempo,” lê-se no relatório.
A confiança nos líderes políticos também sofreu durante a pandemia: aproximadamente dois terços das pessoas inquiridas pela Afrobarometer afirmaram que estavam com o receio de que os seus líderes políticos estivessem a usar a pandemia como uma cobertura para o seu abuso do poder.
“Tornou-se mais difícil para as organizações da sociedade civil estabelecerem-se e operarem, enquanto também enfrentam altos níveis de perseguição,” lê-se no relatório.
As restrições da imprensa e a censura de conteúdo político criado pelos cidadãos também está a registar um aumento a nível do continente.
Juntamente com estas questões, o relatório da fundação prevê desafios para o futuro pós-COVID-19 de África na educação, na vida das mulheres e crianças, nas redes de segurança social, equidade digital, abastecimento de energia eléctrica constante e nas redes de transportes confiáveis. O relatório completo encontra-se aqui [inserir a ligação: http//mo.ibrahim.foundation/covid-19-africa-chalenging-road-recovery].
“A capacidade de cada país para navegar e eventualmente ultrapassar a pandemia estará enraizada na confiança dos cidadãos,” lê-se no referido relatório.