Um Mundo do Crime
África Junta-se aos Esforços Globais da Luta Contra Instituições do Crime Organizado
EQUIPA DA ADF
A versão dos filmes do crime organizado apresenta, tipicamente, cartéis de droga da América Latina com armamento pesado ou grupos de máfia italiana que gerem esquemas de extorsão.
O verdadeiro crime organizado é mais sofisticado, diversificado ou abrangente do que qualquer filme famoso ou estereótipo cultural. Os criminosos operam de diversas formas, grandes e pequenas, com diversos interesses numa variedade de arenas.
Este também é o caso de África, e o continente tem ganhado cada vez mais a atenção da comunidade internacional no que concerne a uma totalidade de crimes apreciados pelas redes criminosas organizadas. Desde a caça furtiva ao tráfico de seres humanos, contrabando de drogas aos crimes marítimos, a África apresenta uma série de instituições do crime organizado.
A África também oferece uma lição na variedade e tipos sofisticados de crime organizado, com quatro principais categorias evidentes no continente.
Os Quarto Tipos de Crime Organizado
Um artigo de Mark Shaw, director da Iniciativa Global Contra o Crime Organizado Transnacional, publicado pelo Instituto de Estudos de Segurança (IES), apresenta os quatro principais tipos de crime organizado em África. Existem algumas sobreposições entre eles.
O primeiro tipo é uma organização ao estilo da máfia, presente onde tais actividades criminosas já estão bem estabelecidas e definidas pela violência. A Cidade do Cabo, na África do Sul, é um exemplo.
“As gangues da cidade e as redes de crime — incluindo ligações corruptas no seio da polícia — permitem estabelecer paralelos com a máfia italiana,” escreve Shaw. “Os criminosos das gangues ou de estilo da máfia, na Cidade do Cabo, matam, extorquem, traficam substâncias ilícitas e têm ligações com o Estado.”
Este primeiro tipo pode parecer de, alguma forma, diferente num outro lugar. Na Nigéria, por exemplo, os grupos de criminosos operam ao estilo da máfia, com mais alcance global, mas menos controlo do território doméstico. Os criminosos nigerianos têm influência na Itália, especialmente se estiverem relacionados com o tráfico de seres humanos.
A Organização Internacional para as Migrações (OIM) comunicou que aproximadamente 80% de raparigas que chegam à Itália, provenientes da Nigéria, são potencialmente traficadas para exploração sexual, como a prostituição. Dados da OIM, de 2011 a 2016, apresentam um aumento de mulheres e raparigas não acompanhadas oriundas da Nigéria que entram na Itália numa escala quase que industrial.
O tráfico, às vezes, é o trabalho das gangues criminosas, muitas vezes, designadas de confraternidades, tais como a Confraternity of the Supreme Eiye — também conhecida como os Airlords — e the Black Axe, de acordo com um relatório da InfoMigrants.
A segunda classificação envolve redes que “ligam pessoas de fora e pessoas de dentro do continente” para movimentar materiais ilícitos, de acordo com o artigo de Shaw. Estas redes tendem a parecer-se menos com interesses criminosos organizados típicos e podem incluir traficantes de drogas da África Oriental e Ocidental.
Shaw cita a Guiné-Bissau como um exemplo. Há muito apelidada de um narcoestado pela comunidade internacional por causa do alto fluxo de drogas que passa pelo país e o alto nível de oficiais envolvidos nesse comércio, a realidade pode ser diferente. “Um exame mais aprofundado mostra que se assemelha mais com um conjunto de redes criminosas interligadas que protegem um comércio de trânsito,” escreve.
O comércio de drogas da África Oriental prioriza mais a heroína do que a cocaína, mas condições semelhantes também existem. O ópio, tipicamente trazido do Afeganistão, desce pela costa leste de África em pequenos barcos a motor, designados por dhows, cada um com a capacidade de esconder entre 100 e 1.000 quilogramas de drogas. Esta jornada constitui a “rota sul” descrita no “A costa da heroína: uma economia política ao longo do mar da África Oriental,” escrito por Simone Haysom, Peter Gastrow e Shaw, para o programa da União Europeia, Melhorar a Resposta de África ao Crime Organizado Transnacional (ENACT).
Os dhows são capazes de evitar a detecção pelos satélites e a detecção pelos barcos de patrulha, e eles param ao largo da costa para que pequenas embarcações possam vir descarregar as drogas e levá-las de volta para pequenas ilhas, praias e portos. Este processo repete-se ao longo da costa desde Somália até Moçambique, de acordo com o artigo do ENACT. Depois, as drogas prosseguem por terra e para outros mercados.
A heroína que transita por esta rota, muitas vezes, tem como destino a Europa e países insulares, mas o artigo do ENACT explora o efeito da rota sobre os países africanos de trânsito. É aqui onde podem ser vistas as ligações entre pessoas de dentro e de fora.
O ópio é movimentado do Afeganistão para o Paquistão, onde se diz que as redes de drogas africanas têm ligações. A partir dali, as drogas prosseguem para países como Somália, Quénia, Tanzânia e Moçambique.
O Porto de Mombasa, o maior da África Oriental, é utilizado por vários traficantes de droga quenianos, de acordo com o documento do ENACT.
O documento do IES, de Shaw, alista o terceiro tipo das principais instituições do crime organizado como sendo um cruzamento entre aquilo que ele chama de “organizações políticas soltas,” tais como milícias e outros grupos armados e traficantes.
Os Estados podem ser uma influência nesta categoria, quer directa ou indirectamente, ajudando ou impedindo grupos através da protecção política. Shaw escreve sobre três exemplos de lugares onde este tipo de crime prospera: a Líbia, que viveu anos de anarquia desde a queda de Muammar Gadhafi; o Sahel, que foi devastado por anos de violência extremista; e a África Oriental, que viu a violência extremista a evoluir em metástase para fora, a partir de Somália.
“A Terceira categoria está directamente ligada a Estados fracos em zonas de conflito em diferentes partes de África,” escreve Shaw. “Na maior parte, não pode existir sem a instabilidade que ocorre em tais condições. Os seus praticantes são, muitas vezes, proto-Estados fracos com alguma forma de controlo geográfico, mas este é limitado e continuamente desafiado, em particular, quando grupos criminosos oferecem formas alternativas de governação.”
O Sahel e a região circunvizinha são um excelente exemplo deste tipo. A instabilidade, que começou em 2012 com a rebelião dos Tuaregues no norte do Mali, cresceu para englobar maior parte da região, e armas e militantes provenientes da Líbia vieram em massa depois da queda de Gadhafi. Fronteiras porosas e espaços não governados exacerbaram o problema numa região historicamente ligada a uma variedade de crimes de tráfico, incluindo drogas, cigarros e seres humanos.
Um documento de 2019, da Iniciativa Global contra o Crime Organizado Transnacional, com o título “Depois da Tempestade: Crime organizado ao longo do Sahel-Sahara depois da agitação na Líbia e no Mali” indica que o crime nesta região mudou devido a um influxo de respostas de segurança, nestes últimos anos. A instabilidade nas fronteiras do Mali, Níger e Líbia, na verdade, atrapalhou o tráfico de drogas, diz o relatório, e as armas que fluem de uma Líbia que entrava em colapso reduziram com o passar dos anos, com a oferta a ter dificuldades de satisfazer a crescente procura.
O tráfico e o contrabando de seres humanos explodiu nos últimos 10 anos, mas desde então reduziu ou foi obrigado a seguir meios subterrâneos pelas parcerias entre Estados europeus e Estados do Sahel-Sahara, demonstra o relatório. Entretanto, o tráfico de medicamentos falsificados — especialmente o analgésico Tramadol — está a aumentar, assim como estão a aumentar os mercenários, esquemas de protecção e outros tipos de banditismo.
“Traficantes de alto nível convertem lucros em capital político para obter protecção do Estado ou ganhar legitimidade social entre as populações locais ou ambas,” afirma o relatório. Continua a afirmar que a “falta de oportunidades económicas, a generalização da corrupção, instabilidade e insegurança, fraca capacidade de aplicação da lei e a integração regional da África Ocidental e o Magrebe na economia global aliam-se para tornar o Sahel um campo fértil para economias criminosas.”
O quarto e último tipo de crime organizado prevalecente em África é o crime cibernético, escreve Shaw. Tem a tendência de aumentar à medida que a tecnologia e o acesso à internet crescem no continente. De acordo com o “Relatório de Ameaças de Segurança da Internet de 2019” da Symantec, um em cada 131 e-mails na África do Sul, no ano anterior, era malicioso, a taxa mais alta do mundo. No mesmo período, um em cada 1.318 e-mails, na África do Sul, fazia parte de um ataque fraudulento para o roubo de identidade, phishing scam, a quinta taxa mais elevada do mundo.
Karen Allen, conselheira de pesquisas sénior do IES, em Pretória, África do Sul, escreveu que os países africanos devem estar preparados para crimes cibernéticos dependentes e crimes cibernéticos possibilitados. O primeiro utiliza a tecnologia informática para criar novos crimes. O segundo usa as novas tecnologias para cometer crimes mais tradicionais tais como a lavagem de dinheiro.
Em Janeiro de 2018, alguns dentro da União Africana acusaram o governo chinês de invadir os computadores, em Adis Abeba, na Etiópia, na sede, e baixar informação confidencial, reportou o Financial Times. Esta operação de invasão, que a China não admitiu, alegadamente ocorreu no período nocturno, entre Janeiro de 2012 e Janeiro de 2017, desde a meia-noite até 2 horas da madrugada. A China financiou a sede da UA e construiu uma das suas empresas estatais.
Fica claro que os crimes cibernéticos serão uma preocupação africana por muitos e muitos anos.
CRIMES LIGADOS À FAUNA BRAVIA
África possui algumas das espécies da vida selvagem mais majestosas e icónicas do mundo. Mas embora estes tesouros atraiam milhares de turistas através dos safaris, eles também atraem intenções criminosas de ganhar lucro a partir de partes de animais.
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