EQUIPA DA ADF
Agastados com o facto de os arrastões estrangeiros os privarem continuamente de alimentos e rendimentos, os pescadores artesanais do Gana estão a utilizar um novo aplicativo para smartphones a fim de detectar e denunciar a pesca ilegal.
Mais de 100 pescadores do Gana estão a utilizar o aplicativo chamado Dase, que significa “provas” em Fante, uma língua do local. Foi desenvolvido recentemente pela Fundação para a Justiça Ambiental, uma organização não-governamental que trabalha para combater a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada na África Ocidental.
As pescas são de importância vital para o Gana, onde mais de 100.000 pescadores e 11.000 canoas operam, de acordo com Steve Trent, director-executivo da fundação. O aplicativo também está a ser desenvolvido para ser utilizado na Libéria e na Serra Leoa.
No Gana, a “pesca marítima é a base de sustento de mais de 2,7 milhões de pessoas — quase 10% da população — e mais de 200 vilas costeiras dependem da pesca como a sua fonte primária de rendimento,” disse Trent à ADF num e-mail. “Contudo, as unidades populacionais de peixe estão a registar um declínio acentuado, impulsionado, na sua maioria, pela pesca ilegal generalizada praticada por arrastões industriais de proprietários chineses.”
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Quando um arrastão é suspeito de praticar a pesca ilegal, um pescador artesanal pode abrir o aplicativo e fotografar a embarcação — incluindo o seu nome e número de identificação — para gravar a localização. O aplicativo faz o upload da denúncia numa base de dados central que as autoridades podem utilizar para apanhar e penalizar os prevaricadores.
Especialistas dizem que a pesca ilegal pode dizimar completamente as unidades populacionais de peixe pelágico do Gana, como é o caso da sardinha, que reduziu em 80% nas passadas duas décadas, de acordo com a fundação. O peixe pelágico vive próximo da superfície das águas.
“Estas embarcações pescam próximo da costa, em zonas reservadas para pescadores de pequena escala, e utilizam métodos proibidos para atacarem espécies de peixe que deviam ser capturadas por comunidades de pesca locais, tais como as sardinhas que já foram gravemente sobre-exploradas,” disse Trent.
O uso do aplicativo “implica que os pescadores de canoas não precisam mais de ficar parados enquanto as embarcações industriais pescam de forma ilegal nos seus locais de pesca,” Nana Jojo Solomon, membro executivo do Conselho Nacional de Pescadores de Canoa do Gana, disse numa reportagem do jornal The Guardian.
A fundação divulgou o aplicativo em Novembro e pretende encorajar os pescadores artesanais a utilizá-lo de forma regular.
“A nossa abordagem é de estabelecer contacto directo com os pescadores através das autoridades tradicionais (chefes pescadores) nas praias onde os barcos desembarcam, nos departamentos das autoridades de pescas e no nosso pessoal local baseado nas comunidades,” disse Trent. “Descobrimos que estabelecer a confiança e oferecer capacitações contínuas aos pescadores para envolvê-los na monitoria é a forma mais eficaz de assegurar [que] informação robusta e executável seja recolhida com o tempo.”
Nos passados 15 anos, os pescadores ganeses experimentaram uma queda de 40% no rendimento médio anual por canoa artesanal, de acordo com a fundação. A contribuir para o declínio está a prática da saiko, o transbordo ilegal de peixe no mar.
Em 2017, a saiko levou 100.000 toneladas de peixe das águas ganesas, custando ao país milhões de dólares em receitas e ameaçando a segurança alimentar e os empregos, disse a fundação. Naquele ano, os arrastões industriais capturaram quase a mesma quantidade de peixe que o sector de pescas local quando se teve em consideração as capturas ilegais e não declaradas, de acordo com um relatório conjunto da Fundação para a Justiça Ambiental e a Hen Mpoano, uma organização não-governamental.
Frederick Bortey é um dos muitos pescadores ganeses que quer que o governo passe a banir os arrastões industriais ilegais.
“Os meus filhos não estão a ter dinheiro para poderem ir à escola,” Bortey disse à Voz da América. “Por isso, é muito doloroso o facto de estarmos a falar sobre isso. Podem tentar expulsar essas pessoas por nós. Gostaríamos que isso acontecesse, para que possamos pescar, também, no nosso próprio país.”