ADF STAFF
Os mauritanos exigem justiça depois da morte de pescadores artesanais, quando o seu barco foi atingido por um grande arrastão chinês. O incidente de inícios de Setembro ocorreu em águas do Atlântico ao largo da costa da cidade portuária de Nouadhibou.
Três dos seis pescadores a bordo do barco mauritano foram mortos e o capitão da embarcação chinesa foi detido, de acordo com uma reportagem local.
Dias depois, centenas de pescadores locais juntaram-se aos familiares dos pescadores mortos e pediram aos líderes mauritanos para expulsarem os arrastões estrangeiros — incluindo aqueles provenientes da China, Rússia e Turquia — das águas mauritanas e darem melhor protecção aos pescadores artesanais e outros marinheiros, porque incidentes marítimos mortais na região são comuns. O naufrágio ocorreu numa zona reservada para pesca artesanal.
Mohameden Obeidat, vice-presidente de um grupo de pesca tradicional, acusou o arrastão chinês de atacar de forma deliberada o barco mauritano, porque a embarcação chinesa tinha desligado as suas luzes e o seu Sistema de Identificação Automática, na escuridão da madrugada, reportou um canal local de notícias, alakhbar.info.
Peter Hammarstedt, director de campanhas da Sea Shepherd Global, uma organização sem fins lucrativos, que trabalha para eliminar a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN), disse que tais tácticas são comuns entre os arrastões que querem evitar detecção em águas protegidas.
“A pesca continua a ser a mais perigosa profissão do mundo, mais ainda para os pescadores artesanais de pequena escala,” disse Hammarstedt à ADF, num e-mail. “A prevalência de arrastões industriais, em zonas em que também existem grandes comunidades de pescadores artesanais, resultou em conflitos, especialmente quando os arrastões entram em zonas protegidas e reservadas aos pescadores não industriais.
“De forma rotineira, os arrastões passam por cima das redes de pescadores locais — muitas vezes avaliadas em vários meses de renda — e, por vezes, também atingem e afundam pirogas e canoas. Conheci pescadores locais na Libéria que me contaram a sua própria experiência, em que embarcações passaram por cima deles. As pessoas afogam-se.”
A embarcação chinesa pertence a Poly Hondok Co., de acordo com uma reportagem da Nouadhibou Today. A empresa chinesa também é conhecida pelos nomes Poly Hondone, Poly Hondong e Fuzhou Hong Dong Yuan Yang.
Em 2010, a Mauritânia assinou um acordo que concedeu acesso a Poly Handok aos seus portos por 25 anos. Pescadores locais ficaram tão chateados com a falta de transparência do acordo que lançaram ovos contra os políticos que votaram a favor do mesmo, reportou a Reuters nessa altura. O parlamento mauritano está a investigar o acordo assinado pelo então Presidente Mohammed Ould Abdel Aziz.
A operação da Poly Handok é actualmente a maior base de pescas da China no estrangeiro, enviando 10.000 toneladas de peixe por ano para a Europa e para os EUA, enquanto também produz farinha de peixe, de acordo com uma reportagem da Seafood Source.
Por muitos anos, os pescadores locais têm vindo a reclamar que os arrastões estrangeiros estão a reduzir gravemente as unidades populacionais de peixe na zona.
Em 2017, um conservacionista chinês entrevistou o capitão de um arrastão chinês ao largo da costa de Nouadhibou e mais tarde escreveu sobre a sua experiência para a Greenpeace.
“Às vezes, capturamos muito” peixe, disse o capitão, que se apresentou como Zheng. “O[s] frigorífico[s] está[ão] cheio[s] de peixe e não há espaço para mais e, por isso, temos de deitar fora toneladas de peixe já capturado.”
A maior parte da captura deitada fora estava morta.
“Por onde a gente passa, não haverá mais peixe a sobrar no oceano,” disse Zheng.
A China demonstrou sinais de que não tem intenções de abandonar as águas mauritanas. Recentemente, o país concedeu um financiamento de 87 milhões de dólares para a construção de um novo porto de pesca, bem a norte de Nouadhibou.