EQUIPA DA ADF
Um jovem trajado de camisete amarela esforçava-se enquanto ajudava a puxar uma rede de pesca do Golfo da Guiné. Um residente da Serra Leoa, Abu Bakr Aconteh, franzia a testa enquanto inspeccionava o lanço.
“Não estamos felizes com isto, porque é uma captura pequena,” disse à BBC.
Assim como muitos pescadores na África Ocidental, Aconteh lança a culpa pela população cada vez mais reduzida de peixe aos arrastões estrangeiros, que são embarcações muito mais grandes e mais sofisticadas do que a canoa de madeira utilizada pela sua tripulação. Aproximadamente três quartos dos arrastões industriais estrangeiros na Serra Leoa são chineses.
Apesar de a maior parte do peixe capturado a nível local ser exportada para a China e para a Europa, a Serra Leoa colecta menos de 10% do dinheiro ganho pelos pescadores estrangeiros, reportou a BBC. Na Libéria e na Guiné, os lucros são ainda menores.
“Gostaríamos que o governo tirasse estas pessoas para longe daqui — para pararem de pescar neste país,” disse Aconteh.
Apesar de a Serra Leoa ter imposto uma moratória de pesca de um mês em 2019 para reconstituir as unidades populacionais de peixe, o seu governo também concede licenças a arrastões industriais chineses para pescarem em suas águas. O governo colecta taxas de licenças, mas os arrastões dizimam as unidades populacionais de peixe e danificam o ecossistema. A falta de peixe faz com que não haja dinheiro e comida para as famílias locais.
É um cenário comum em toda a África Ocidental, onde aproximadamente 7 milhões de pessoas dependem da pesca para obterem um rendimento e até 50 milhões de pessoas se encontram em risco de insegurança alimentar e má nutrição.
Naquela região, sabe-se que os arrastões chineses costumam envolver-se em pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (INN), muitas vezes, pescando em águas reservadas para pescadores artesanais locais, mantendo registos fraudulentos, transmitindo localizações e dados de identificação falsos e ainda subornando ou ameaçando os trabalhadores das instituições de pesca locais.
Estima-se que a pesca INN e outras práticas comerciais marítimas ilegais podem custar aos países da África Ocidental “aproximadamente 1,95 bilhões de dólares em toda a cadeia de valores pesqueiros e 593 milhões por ano em rendimento familiar perdido,” de acordo com um artigo recente da revista The Africa Report.
Através de empréstimos e licenças, a China aparentemente pretende expandir a sua presença marítima comercial na África Ocidental. Recentemente, o Gana obteve um financiamento da China na ordem de 60 milhões de dólares para construir um novo porto de pesca em Jamestown. A Mauritânia beneficiou-se de um empréstimo chinês de 87 milhões de dólares para a construção de um novo porto próximo de Nouakchott e a Serra Leoa aceitou um empréstimo de 708 milhões de dólares da China para realizar uma grande ampliação do porto de Freetown.
” Os serviços diplomáticos chineses, que possuem uma das maiores redes de embaixadas do que qualquer potência a nível global, são muito pro-activos na procura de vagas para empresas chinesas de pesca em África,” Mark Godgrey, que faz a cobertura da frota chinesa de pesca longínqua para a Seafood Source, disse à ADF num email.
“Os diplomatas reúnem-se regularmente com ministros de pescas no país anfitrião e são, por vezes, acompanhados por executivos de empresas de pesca que procuram obter uma licença para operarem. Estes tipos de apresentações não são fora do comum no mundo dos negócios, mas o que difere é a natureza opaca dos acordos feitos.
A proliferação de fábricas chinesas de produção de farinha de peixe na Mauritânia, no Senegal e na Gâmbia agrava os receios dos africanos da África Ocidental que dependem da pesca para o seu sustento. Para além de causar poluição, que destrói os ecossistemas e sufoca os residentes locais, as fabricas — alimentadas na sua maioria por grandes arrastões industriais — produzem um produto feito à base de unidades populacionais de peixe que se encontram em rápido declínio.
A maior parte da produção de farinha de peixe da África Ocidental é enviada para China, o maior importador de farinha de peixe no mundo.
Isso deixa os pescadores locais com redes, carteiras e estômagos vazios — e uma perspectiva pouco animadora para o futuro.
“As pessoas pensam que já não há mais peixe,” Gaoussou Gueye, um pescador veterano senegalês, disse à Deutsche Welle.